A Justiça é Cega

Nos últimos dias tenho me debatido muito com uma série de pensamentos. São pontos de tensão, questionamentos de fé, ponderações acerca do mundo de hoje, sobretudo do mundo cristão brasileiro. E é claro que analiso essa questão do ponto de vista ético/moral sobre as influências espirituais no nosso pensamento.
Este texto é uma condensação de vários questionamentos que partem da minha realidade, da minha história de vida e da minha visão de mundo. Logo, aceite quem quiser, quem não quiser que viva com a sua e continuamos amigos, ou não.
Quando pensei no título A JUSTIÇA É CEGA, é muito mais ampla do que normalmente pensamos. Esse talvez seja meu maior questionamento. E talvez a frase deveria terminar com um ponto de interrogação porque ainda não tenho a resposta.

Vai aqui um breve relato sobre minha vida,  o que moldou a minha visão de mundo. Durante toda minha infância, tive uma vida pobre, que achava até alguns colegas que eram classe média baixa, ricos pra mim. Lembro de alguns colegas que eram filhos de militares (de baixa patente), outros filhos de gerentes comerciais, outros do ramo da hotelaria, todos com baixa escolaridade, mas ainda assim bem melhores de vida que a minha família.
Eu tinha de levar cream-crack com margarina como lanche pra escola, e para beber um Ki-suco numa garrafinha térmica de café. Enquanto isso, meus colegas lanchavam na lanchonete da escola e outros nos cursinhos preparatórios.
Mas uma coisa que sempre tive em mente foi o senso de justiça. Nunca concordei com pessoas boas sofrerem enquanto pessoas más vivem uma vida na maior tranquilidade. Sempre fui um defensor dos "fracos e oprimidos", até no futebol (quando não era meu time) eu torcia para que o mais fraco vencesse.
Lembro de ter entrado numa briga tentando defender uma mulher grávida (cuja mulher nem queria ser defendida) que apanhava do companheiro dentro do ônibus.

Me decidi seguir pelo caminho do cristianismo porque os ensinamentos de Jesus sempre vieram ao encontro daquilo que eu pensava como certo para o viver. Como eu já disse, mesmo vivendo em uma igreja pequena, a diversidade social era grande, mesmo não parecendo. Logo acabaram me "adotando" mas que com o passar do tempo o amor era só uma via de mão única. Tipo... você é filho quando é bom pra mim, quando não for, pode ser um bom amigo de longa data. Claro que isso só fui comprovar mesmo anos e anos depois, mesmo no fundo sabendo que era isso.

O tempo foi passando, vi e viví muita coisa dentro do ambiente religioso, e hoje questiono ainda mais muitas coisas que tenho visto de norte a sul de leste a oeste. Desde às igrejas históricas até às neopentecostais, sempre tenho visto a mesma realidade.
Quando me pergunto sobre se a justiça é cega, a pergunta é embasada em uma série de relatos que vi e viví. Me pergunto o por quê de tantas pessoas prosperarem fazendo tanta coisa errada? Ao longo desses mais de 30 anos vividos dentro de igrejas, vi de tudo um pouco. Pastores que enriquecem enquanto suas ovelhas definham. Recebem salários altíssimos enquanto a maioria de suas ovelhas vivem de um salário mínimo. Já soube de pastor que reuniu a liderança pra pedir reajuste de salário de 80 mil reais pra 100 mil. Claro que é de uma igreja que tem condições de pagar, que está num dos bairros mais caros de uma das cidades mais caras do nosso país. Mas me pergunto se esse dinheiro todo não poderia ser melhor empregado na ajuda aos necessitados, em missões mundo à fora, no combate à dependência química, e em muitas outras áreas.

Durante minha vida, tanto dentro da igreja  quanto fora, como maestro, tive um relacionamento com o dinheiro de forma mais honesta possível. Trabalhei como diretor de cultura de uma cidade mineira, e durante todo o tempo em que estive alí nunca levei um clipe pra casa. Mesmo tendo toda a facilidade, e até mesmo incentivo pra "enriquecer" aproveitando o momento, decidi ter uma vida simples e honesta, pensando que dormir com a cabeça  leve no travesseiro é a melhor coisa do mundo. Mas para a minha surpresa, mesmo sempre tendo agido com ética e moral meu travesseiro não me deixa dormir.
No meu tempo como agente cultural nunca tirei de projetos, verbas que não fossem exclusivamente ligadas ao meu trabalho. Nunca superfaturei nada, nunca forjei uma nota fiscal, nunca me apropriei de algo que não fosse fruto do meu trabalho. Nunca faltei com a verdade, nem nas reuniões com meu contador. Quando me perguntava: Quanto o senhor quer pagar de imposto? Eu respondia: Quanto devo!

Hoje eu não invejo a prosperidade do ímpio (que é condenada pela Bíblia), nem a prosperidade do "justo". Nessa balança fica até difícil saber quem é justo e quem é ímpio. O que eu não entendo e questiono, é por que as pessoas lucram, crescem financeiramente, enriquecem, fazendo trapaças, subornando pessoas e políticos, lavando dinheiro, traficando influência, burlando leis...
Não é pequeno o número de pastores que burlam leis trabalhistas. Contratam pessoas, com título de "ministro religioso" mas fazem deles empregados, e em alguns são os piores patrões do mundo.
Não é pequeno o número de pastores que usam o fato de a igreja estar isenta de impostos para burlar uma série de questões legais. Por que essas pessoas continuam prosperando enquanto aqueles que vivem uma vida honesta, ética, continuam pobres, sem posses e muitos tendo que continuar como "empregados" desses homens.
Há um número enorme de pastores que forjam atas de assembléias que nunca existiram, simplesmente para se manter no poder, ou para não pagar impostos que são devidos, ou para não pagar direitos que são devidos. Por que esses continuam prosperando?

Minha pergunta é até para Deus. Quando será que o justo prosperará? Quando a justiça será feita? Quando aquele que é honesto poderá andar de cabeça erguida por poder dar uma escola de qualidade pro filho, ter um plano de saúde digno, ter um bom plano de aposentadoria?
Será nunca, meu Deus??? Quando, aquele que fala a verdade, será honrado? Porque falar a verdade hoje pode ser uma sentença de morte.
Vivo no meio de tanta hipocrisia que não sei nem se me cabe mais nesse mundo. Tanta gente criticando a corrupção na política, mas dentro de suas igrejas são tão corruptos quanto. Até mesmo dentro das escolas ditas "cristãs" estão podres por causa da corrupção. Filhos de pastores e funcionários tem tratamento diferenciado, não precisam de prova de seleção pra entrar, enquanto que os filhos de nós, mortais, precisam se submeter a um rigoroso critério de seleção, e se houver uma "bolsa" prometida, aí que o critério aumenta. Porque é mais fácil dizer que o candidato não passou do que dizer a quem pediu a bolsa que não vai dar o benefício.
Miséria espiritual, miséria moral, miséria ética! Estamos cercados por todos os lados!!!

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