Usina que Canta 4 - Noite

Compartilho com vocês um poema que marcou minha vida. Primeiro, quando cantei sob a regência de Elza Lackschevitz, a primeira das grandes maestrinas que passaram por minha vida. Depois conhecer pessoalmente o autor da música que embala esses versos de Cecília Meireles - Ronaldo Miranda, um dos maiores compositores brasileiros e, na época, diretor da Sala Cecília Meireles. Coincidências? Não acredito nelas.
E finalmente, por eu mesmo ter tido o prazer de encantar, Brasil à fora, platéias de músicos com a mesma canção, só que agora nas vozes do meu Coral Usina.
A primeira vez que cantamos pra valer foi em Vitória, ES. Tínhamos sido convidados para participar do Encontro de Coros de Vitória - o CantarES (Nome de outra obra prima de Ronaldo Miranda. Outra coincidência? Não, não acredito). Chegamos na manhã de sábado e fomos todos para uma padaria tomar café, e logo depois nossa tradicional cantoria para quem assiste. A noite nos dirigimos ao teatro da Universidade. Estava lotado. O dirigente era muito engraçado é divertia a platéia entre uma apresentação e outra. Quando apresentamos NOITE, a platéia ficou completamente em silêncio, as harmonias rodavam o teatro e eu podia ouvir as reverberações acústicas. Ouvia claramente as séries harmônicas produzidas pelo bom som do coral, ouvia cada frequência produzida pelas notas como num instrumento não temperado. E ao terminar, depois do meu corte, eternos 4 segundos de silêncio até que platéia explodisse em aplausos. Que sensação maravilhosa! Meu passado juntou-se ao presente, e ambos se tornaram um, como se estivesse fora do Cronos, fora do tempo. Ótima lembrança! 
Segue então o poema...

Úmido gosto de terra,
cheiro de pedra lavada
- tempo inseguro do tempo! -
sombra do flanco da serra,
nua e fria, sem mais nada.

Brilho de areias pisadas,
sabor de folhas mordidas,
- lábio da voz sem ventura! -
suspiro das madrugadas
sem coisas acontecidas.

A noite abria a frescura
dos campos todos molhados,
- sozinha, com o seu perfume! -
preparando a flor mais pura
com ares de todos os lados.

Bem que a vida estava quieta.
Mas passava o pensamento...
- de onde vinha aquela música? -
E era uma nuvem repleta,
entre as estrelas e o vento.

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